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Português na Linha

A disciplina de Português fora da sala de aula. Dicas de ajuda para alunos do 2.º e 3.º ciclo.

Português na Linha

A disciplina de Português fora da sala de aula. Dicas de ajuda para alunos do 2.º e 3.º ciclo.

Mestre Gil apresenta um sapateiro, carregado de formas, acusado pelo Diabo de roubar o povo. O Sapateiro não nega o facto e começa a citar, em sua defesa, a cumprimento de preceitos religiosos: faleceu confessado e comungado, ouviu missas, ofereceu donativos à Igreja e assistiu às horas de finados. É o Diabo quem o elucida que tudo isso nada abona em sua defesa, uma vez que roubava.

Quando o Sapateiro roga ao Anjo que o acolha na barca, este objeta-lhe: «A carrega te embaraça». Mais adiante, esclarece um pouco mais o seu pensamento, quando, referindo-se às formas, adverte o Sapateiro: «Se tu viveras dereito, / elas foram cá escusadas.». Para interpretar convenientemente estes dois passos, só vislumbramos uma solução: as formas tinham sido compradas com o dinheiro que o Sapateiro roubara aos seus fregueses e eram como que a materialização dos seus pecados. Se esta interpretação estiver certa, o dramaturgo não considera as formas só como um elemento distintivo e caracterizador de tipo mas também como objetos que o Sapateiro fora obrigado a levar para o seu julgamento como provas de acusação.

Com toda esta cena, procurou o autor incutir no espectador esta doutrina: os preceitos devotos (ouvir missa, confessar-se, comungar, etc.) só ajudam os que levam uma vida verdadeiramente honesta. É, portanto, mais uma cena moralista de carácter religioso do que a condenação dum Sapateiro, acusado de roubar o povo. Aliás, em muitos outros passos, Mestre Gil defende este ponto de vista: ser-se religioso consiste mais em atuar com espírito evangélico do que assistir ou cumprir os atos externos do culto.

In FIUZA, M., Auto da Barca do Inferno (edição didática), Porto Editora, 2011.

 

Síntese:

O Sapateiro representa a baixa-burguesia, e um grupo de ofícios. Nesta personagem, está novamente presente a critica às práticas erradas da religião.

 

Símbolos cénicos

Avental e as formas de sapatos - Representam os anos que enganou os seus clientes.

 

Caracterização

Falso católico, ladrão e malcriado.

 

Argumentos de defesa

Afirma que morreu confessado e comungado; ouviu muitas missas; fez donativos à igreja; e rezou pelos mortos.

 

Argumentos de acusação

Morreu excomungado (sem confessar os seus pecados); roubou o povo durante trinta anos sem qualquer problema de consciência; as formas que traz simbolizam os seus pecados.

 

Os Parvos têm, no teatro vicentino, uma função cómica, ocasionada pelos disparates que proferem. Assim acontece neste auto, embora, em certos passos, o Parvo se junte às personagens sobrenaturais para criticar os que pretendem embarcar e sirva, algumas outras vezes, de comentador.

Evidentemente que, nos termos desarticulados e ilógicos, ditos pelos Parvos, há, por vezes, muito que refletir e analisar. Neste auto, isso acontece com a célebre resposta ao Anjo: «… Samica alguém:» (ed. de 1518) ou «Não sou ninguém» (ed. de 1562) que tem sido comentada por variadíssimos autores.

A decisão do Anjo de acolher o Parvo, na sua barca, está na lógica da doutrina católica: não pode ser responsabilizado pelos seus atos quem nasceu irresponsável. É o que o Anjo exprime muito sinteticamente com a palavra simpreza. Simplesmente, o Anjo não lhe ordena que embarque imediatamente mas, pelo contrário, manda-o aguardar no cais os futuros companheiros («espera entanto per i»). Mas, no momento próprio, os quatro Cavaleiros da Ordem de Cristo, seus companheiros, embarcam triunfalmente, deixando o Parvo no cais. A verdade é que quando chega a barca seguinte, já ele lá não estava…

 

In FIUZA, M., Auto da Barca do Inferno (edição didática), Porto Editora, 2011.

 

Síntese:

Com esta personagem, Gil Vicente não pretende criticar nenhuma classe social, mas sim tornar a peça menos monótona e criar um efeito cómico; representa os pobres de espírito.

 

Símbolos cénicos

A personagem não transporta símbolos cénicos, pois tudo o que fez foi sem consciência alguma.

 

Caracterização

Simples e inconsciente; usa uma linguagem grosseira.

 

Argumentos de defesa

O Anjo defende o Parvo, destacando a sua simplicidade e afirmando que não errou / pecou por malícia.

 

ONZENEIRO

Eis um cristão que conservava algo de comum com os judeus: a sua paixão pelo capital. Era um usurário que enriquecera à custa dos altos juros de dinheiro, que emprestara aos necessitados – um antepassado dos nossos modernos penhoristas, a quem o Diabo chama, com toda a propriedade, seu «parente».

Apresenta-se no estrado com um bolsão que ocupa quase toda a barca. O Onzeneiro informa-nos que vai vazio, certamente porque não pudera trazer com ele os vinte seis milhões de cruzados que deixou bem escondidos no fundo de uma arca. Mas é só neles que ele pensa e chega a rogar ao Diabo que o deixe voltar ao mundo para ir buscá-los. Mas ali, no espaço para além da vida, apresenta-se tão pobre que nem sequer dispõe duma moeda para pagar ao barqueiro. Isto leva-o a pensar, embora erradamente, que o companheiro do Diabo troça dele por o ver tão miserável.

 

In FIUZA, M., Auto da Barca do Inferno (edição didática), Porto Editora, 2011 (adapt.)

                                       

Síntese:

 

O Onzeneiro simboliza a burguesia e um vício social da época. Era um usurário que enriquecera à custa de altos juros do dinheiro que emprestara aos necessitados, a quem o Diabo chama meu parente.

 

Símbolos cénicos

Bolsão – símbolo da sua atividade e, por isso, dos seus pecados (a ambição e avareza).

 

Caracterização

Avarento e ambicioso; representa a prática de cobrar juros muito elevados (11%).

 

Argumentos de defesa

Afirma que a bolsa está vazia e quer voltar à terra para ir buscar dinheiro para pagar a passagem (referência ao Mito de Caronte);

 

Argumentos de acusação

Acusam-no de ter sido sempre ajudado por Satanás; e que o bolsão, mesmo vazio, ocupará muito espaço com o seu pecado (a avareza).

FIDALGO

Gil Vicente apresenta o Fidalgo com toda a sua vaidade e presunção, «fumoso», ricamente vestido e seguido de um pajem que lhe segurava a cauda do manto e lhe transportava uma cadeira de espaldas. Habituado a gozar de privilégios especiais, o Fidalgo nem sequer pensa que poderá ir para o Inferno. Assim, para justificar o seu direito a entrar na barca celestial, apresenta apenas ao Anjo, como único argumento, a sua condição social: «Sou fidalgo de solar/é bem que me recolhais».

A sua altivez e vaidade levam-no a exigir que todos o tratem por «Vossa Senhoria» de acordo com os seus pergaminhos nobiliárquicos. Por o Anjo lhe ter dito uma frase que ele considerou pouco cortês («Pera vossa fantesia/mui estreita é esta barca»), o Fidalgo reage logo violentamente: «Pera senhor de tal marca/não há qui mais cortesia?». Mas o Diabo, momentos antes, tratara-o por tu, sem qualquer reação da parte do Fidalgo. Porquê? Certamente porque este ficou tão espantado com a revelação e acusação do Diabo que nem teve presença de espírito para o meter na ordem. Aliás é o próprio Diabo quem, passado este breve momento escarninho e zombeteiro, passa prontamente para o tratamento cerimonioso, depois dum verso de transição: «embarca ou embarcai». Mas, na cena seguinte, depois de ter sido humilhado e condenado, vemos o Fidalgo tão abatido e deprimido que, quando o Onzeneiro o trata por Vossa Senhoria, o Fidalgo já reage de modo inverso: «Dá ó demo a cortesia!» Mas, nessa altura, já não era um fidalgo mas um pobre condenado ao Inferno; o próprio Diabo ameaça espancá-lo: «dar-vos-ei tanta pancada/C’um remo, que renegueis!».

Ao Fidalgo parece-lhe a barca infernal um «cortiço», isto é, uma barca muito ordinária e reles para transportar um nobre tão poderoso e importante como ele. Mas o Diabo e o Anjo formulam as suas críticas, que se podem resumir assim: que ele vivera a seu prazer, isto é, que fizera tudo quanto quisera, que se entregara aos prazeres, fora tirano e, consequentemente, desprezara os pequenos, ou sejam, os elementos do povo. Para demonstrar que ele vivera a seu prazer, analisa Gil Vicente a vida sentimental do Fidalgo, repartida entre duas mulheres: a esposa e a amante. Mas o que o Fidalgo ignora e que o dramaturgo denuncia, para caracterizar melhor a sociedade do seu tempo, é que tanto uma como a outra lhe eram infiéis e tinha cada uma delas o seu amante. Não se trata, portanto, dum pormenor secundário mas dum elemento essencial para a caracterização do tipo e da sociedade em que estava inserido.

Mas Gil Vicente não condena só aquele aristocrata mas todos os seus antepassados, como afirma expressamente o Diabo quando informa o Fidalgo de que passará para o Inferno assim como «passou vosso pai», isto é, o autor generaliza e condena a nobreza como classe social.

O criado ou pajem que acompanha o Fidalgo não entra em nenhuma das barcas. Porquê? Evidentemente que não representa ali um tipo, uma alma dum defunto, mas um simples elemento caracterizador e distintivo, tratado a nível de objeto, que o dramaturgo risca do palco assim que deixa de ser necessário. Mas a sua função simbólica deveras importante na medida em que representa um elemento do povo, a principal vítima da opressão da nobreza que, manifestamente, não poderia acompanhar o fidalgo na sua viagem para o Inferno.

 

In FIUZA, M., Auto da Barca do Inferno (edição didática), Porto Editora, 2011.

                                       

Síntese:

O Fidalgo representa a nobreza e critica aqueles que só pensam no seu estatuto social.

 

Símbolos cénicos

Paje(m) - Simboliza a tirania e opressão que exercia sobre o seu povo.

Cadeira d’espaldas - Representa a falsa vivência da religião.

Manto - Símbolo do estatuto social e da sua vaidade.

Caracterização

Tirano, vaidoso, altivo, infiel e exuberante

 

Argumentos de defesa

É um fidalgo de solar; tem quem reze por ele na terra.

 

Argumentos de acusação

Viveu uma vida de prazeres; deve seguir o destino do pai, que também foi condenado ao Inferno; é tirano, vaidoso e despreza os mais fracos.

 

 

 

O Auto da Barca do Inferno, reflete, à semelhança de outras obras de Gil Vicente, sociedade da época, sendo possível traçar um quadro fiel das classes sociais apresentadas, dos seus hábitos, defeitos e virtudes.

O Auto da Barca do Inferno data de 1517 e é considerado uma moralidade. As moralidades eram representações cujas personagens simbólicas encarnavam vícios ou virtudes com o objetivo de moralizar a sociedade.

► Resumo

1.ª cena

Faz-se a apresentação da barca do Inferno. O Diabo dialoga com o seu companheiro, revelando uma grande euforia e pressa de que tudo esteja preparado para o embarque das almas e para a partida rumo ao Inferno. Após esta breve apresentação, inicia-se o desfile das várias personagens-tipo.

 

2.ª cena

A primeira personagem a entrar em cena é um Fidalgo, que traz consigo um pajem, um criado, que lhe segura a cauda do manto e uma cadeira. O Fidalgo pertence à nobreza e, por isso, acha que não vai para o Inferno, mas o Anjo não o deixa entrar na barca da Glória pelos seus pecados. O Fidalgo acaba por embarcar na barca do Inferno, enquanto o moço sai de cena.

 

3.ª cena

A segunda personagem é um Onzeneiro, que viveu a amealhar dinheiro à custa dos outros. Por isso entra com uma bolsa tão grande que quase não cabe na barca. O Diabo quer que ele entre desde logo na sua barca, mas o Onzeneiro dirige-se primeiro à barca da Glória, sendo também repelido pelo Anjo. No entretanto, pede ao Diabo que o deixe voltar à terra para ir buscar um dinheiro que deixou escondido, mas o Diabo obriga-o a embarcar.

 

4.ª cena

A terceira personagem a entrar é o Parvo, chamado Joane, que conversa com o Diabo, insultando-se um ao outro. Por ser uma personagem que não se pode responsabilizar pelos seus atos, o Anjo promete levá-lo para o Paraíso; entretanto fica na praia onde assiste e comenta o desfile das outras personagens.

 

5.ª cena

A quarta personagem é um Sapateiro, João Antão, que vem carregado de formas. Como passou a vida a roubar o povo é condenado à barca do Inferno, mas primeiro ainda tenta a sorte junto do Anjo. De nada lhe adianta e entra na barca do Inferno.

 

6.ª cena

Entra a quinta personagem, um Frade, a cantar, que traz pela mão uma moça, Florença, e ainda um traje de esgrimista por baixo do hábito. Como viveu uma vida de pecado, o Diabo também o convida a entrar na barca, mas ele e Florença dirigem-se ao Anjo, que os rejeita. Entram os dois na barca do Inferno.

 

7.ª cena

Brízida Vaz é a sexta personagem a entrar em cena. Traz consigo um grupo de moças que entregou à prostituição. No entanto, e porque também é alcoviteira, ainda se acha digna de entrar no Céu. Como tal não é possível, entra na barca do Inferno, e as suas moças abandonam a cena.

 

8.ª cena

A sétima personagem a desfilar é um Judeu que traz um bode às costas. Nem sequer dialoga com o Anjo, pois não acredita na religião cristã. Também não entra na barca do Inferno, pois o Diabo decide que ele e o bode irão a reboque, já que era hábito os judeus estarem separados das restantes pessoas.

 

9.ª cena

Entra um Corregedor, que vem carregado de processos. O Diabo acusa-o de se ter deixado subornar várias vezes. Entretanto, entra em cena um Procurador carregado de livros e que também se dirige ao Diabo. Ambos, Corregedor e Procurador, procuram um lugar na barca da Glória, mas acabam por entrar na do Inferno. O Corregedor discute com Brízida Vaz, pois tinha-a condenado.

 

Nota: Embora se verifique a entrada de duas personagens, é habitual considerar-se a cena do Corregedor e do Procurador como uma só, visto que ambas as personagens pertencem ao mesmo grupo socioprofissional e percorrem o espaço cénico simultaneamente.

 

10.ª cena

Surge um Enforcado, que ainda traz a corda ao pescoço, convencido que poderia entrar na barca da Glória. Acaba por entrar também na barca do Inferno.

 

11.ª cena

Finalmente, surgem Quatro Cavaleiros, que morreram a lutar pela Fé - razão bastante para ingressarem na barca da Glória.

A obra Aquilo que os olhos veem ou o Adamastor  mistura com mestria  factos históricos com ficção. Aliás, a obra retrata uma história relatada por uma personagem histórica Mestre João. Este foi um físico e cirurgião no reinado de D. Manuel. 

O enredo tem início com um monólogo de Mestre João que, após longos anos no Oriente, regressa a Portugal. Em determinado ponto da viagem de regresso, ao passar o Cabo da Boa Esperança, mais precisamente Angra de S. Brás, recorda acontecimentos que aí testemunhara muitos anos antes. É dessa forma que Mestre João começa a narrar as suas memórias desse tempo, quando, na nau em que regressava da Índia, recolheu, nesse mesmo local, um náufrago, Manuel.

Manuel é o protagonista da obra e, contrariamente a Mestre João, é uma personagem ficcional que conta também ele uma história fantástica e terrível, passada num momento anterior às próprias memórias de Mestre João. 

Desta forma, conclui-se que a ação centra-se em três tempos distintos: o presente (correspondente à viagem de regresso de Mestre João), o perfeito (o tempo das memórias de Mestre João) e o mais-que-perfeito (relativo às recordações de Manuel). 

Na Cena 1, apresenta-se o narrador da ação, que inicia um monólogo, afirmando que o seu “coração está cheio de memórias e melancolias”. Desta forma introduz a memória do momento em que recolheu Manuel, dado quase como morto. Assim, simultaneamente apresentam-se os antecedentes da ação presente e as personagens principais. Sucedem-se, então,  os acontecimentos que representam a ação central da peça: o encontro do náufrago e o relato da sua história (cena 2 até à cena 13). A cena 14 corresponde ao desenlace da ação. 

Os episódios relatados a partir entre as cena 2 e 4 surgem no tempo presente por encaixe. É no Tempo do Perfeito (que se inicia na cena 2)  que o leitor acede às memórias de Mestre João, quando este conta a história de um náufrago recolhido pelos seus marinheiros. Na cena 4, retoma-se o tempo presente, quando Mestre João abandona as deambulações pelas suas lembranças e ele próprio duvida da veracidade dos acontecimentos que recordara anteriormente. Não compreende como, sendo ele um homem da ciência, poderia acreditar numa história fantástica como o encontro com o Adamastor relatado por Manuel. Já na cena 5, retoma-se o tempo da memória de Mestre João (Tempo do Perfeito), quando Manuel já mais recuperado, consegue ter forças para contar o que lhe acontecera. Neste ponto faz referência ao seu encontro com o Adamastor, apelidando-o de "Demónio" e "Avantesma", dizendo que as naus onde seguiam os seus companheiros foram "atirados pelo mar como bocados de papel” com o objetivo de o atingir. 

Na cena 6, o leitor pode aceder às memórias de Manuel – “ Tempo do mais-que-perfeito” , que surge por encaixe. Então, Manuel inicia a narração de como seguiu as pisadas de seu pai, que integrara a frota de Bartolomeu Dias aquando da passagem do Cabo da Boa Esperança. Explica também que o sonho que tivera, em que salvava o seu próprio pai das garras de Adamastor, o arrastara para aquela situação em que se encontrava. 

PERSONAGENS

Mestre João é um homem das ciências, dominado pela racionalidade. O episódio narrado por Manuel fá-lo duvidar do seu pensamento racional, porque, segundo a sua forma de pensar, figuras como a do Adamastor não existem. No entanto, estas dúvidas não o impedem de sentir curiosidade sobre aquele ser fantástico, chegando mesmo, na cena 12, a considerar a Avantesma como uma criatura natural de Deus. 

Manuel é um adolescente, segundo a sinopse da obra, com  14/15 anos que vive com a mãe e a irmã Ana em Massarelos, nos arredores do Porto. O pai partiu no passado na frota de Bartolomeu Dias, e Manuel já estava assim familiarizado com a vida no mar. Um dia sonha que o pai é atacado pelo Adamastor. Nesse sonho revelador e premonitório, Manuel enfrenta o monstro, laçando-se à água para salvar o seu pai e vence-o. O seu sonho acaba por se tornar realidade, como se pode verificar na fala do pai, acabado de regressar da sua viagem: “ Por pouco morria eu ali! (…) Salvou-me o meu Anjo da Guarda…”. 

Posto isto, Manuel convence-se que o monstro quererá vingança. Algum tempo mais tarde, embarca na armada de Pedro Álvares Carbral, que acaba por naufragar ao lago do Cabo das Tormentas. Com a certeza que o Adamastor o procura, acaba também ele por naufragar, mas sobrevive, embora bastante ferido.

Manuel é, desta forma, uma personagem comum, sem nenhum traço de excecionalidade. O facto de sobreviver ao naufrágio transforma-o num herói, pos é o único que sobrevive da sua armada. 

A figura de Adamastor é de extrema importância na ação, omnipresente em toda a obra, sem nenhuma vez aparecer fisicamente. Esta figura disforme é referida logo no título da obra, introduzida através de uma conunção subordinativa disjuntiva (ou). Esta expressa exactamente a ideia de alternativa, ou seja, o que vemos ("Naquilo que os olhos veem") corresponde à realidade, enquanto a figura do Adamastor corresponde ao irreal e inexplicável. Assim, o Homem tem sempre a oportunidade de acreditar na realidade ou aceitar o inexplicável. 

O texto dramático é escrito com o objetivo de ser representado diante de um público e pode ser escrito em prosa ou em verso, sendo usado o discurso direto para introduzir as falas das personagens. Logo, o texto dramático é predominantemente dialogal. A ação das personagens é apresentada num determinado tempo e espaço. Para além das falas das personagens, existem ainda as didascálias ou indicações cénicas, que nos dão informações sobre a caracterização, gestos, comportamento e/ou movimentação das personagens, bem como indicações sobre a iluminação, sons, adereços ou cenário. Estas indicações não são incluídas na representação teatral ou na leitura do texto.

 

Caraterísticas do texto dramático:

É constituído por:

Texto principal composto pelas falas dos atores que é ouvido pelos espetadores;

Texto secundário que se destina ao leitor, ao encenador da peça ou aos actores e podem incluir:

 

  • listagem inicial das personagens;
  • indicação do nome das personagens no início de cada fala;
  • informações sobre a estrutura externa da peça (divisão em actos, cenas ou quadros);
  • indicações sobre o cenário e guarda roupa das personagens;
  • indicações sobre a movimentação das personagens em palco, as atitudes que devem tomar, os gestos que devem fazer ou a entoação de voz com que devem proferir as palavras;

 

Discurso dramático:

Monólogo – uma personagem, falando consigo mesma, expõe perante o público os seus pensamentos e/ou sentimentos;

Diálogo – falas entre duas ou mais personagens;

Apartes – comentários de uma personagem que não são ouvidos pelo seu interlocutor.

 

      Classificação das personagens quanto ao relevo:

  • protagonista ou personagem principal
  • personagens secundárias
  • figurantes 

Outras características:

  • Ausência de narrador.
  • Predomínio do discurso na segunda pessoa (tu/vós).

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